quinta-feira, 22 de fevereiro de 2007

Minha Realidade

Se não fossemos todos escravos do tempo, eu poderia estar empinando uma pipa agora.
Acho que nunca impinei uma pipa.
O mais próximo disso que lembro-me é ver meu irmão mais velho com uma grande pipa na antiga garagem dos meus avós. Próximo a mesa de ping-pong, perto da salinha onde ficavam as bicicletas. Como sinto saudades daquela casa.
Aquela escada de carpete e aquelas pilastras brancas. Aquelas pilastras que para mim foram árvores muito altas, esconderijos aonde os vilões sequestravam meus bichinhos de pelúcia. O chão do andar de cima que fazia muito barulho quando eu e meus irmãos pulávamos. O teatrinho de fantoches. As brincadeiras de selvinha. Aquela cozinha branca com armários mágicos. A inveja de minha irmã na mesa de jantar. A raiva de minha prima por dizer que a Pippona não passa de uma boneca. A saudade de conseguir brincar sosinha. Eu e as pilastras. Eu, os bichinhos e as bonecas. Ninguém para discordar da minha imaginação. Ninguém para me dizer que um urso não pode voar. A prova de que a realidade não importa. Pelo menos não importava, não quando eu podia ser sozinha, quando não precisava me interagir com o outro, com o padrão do que é chamado de real. A realidade não passa de uma simples teoria para sermos aceitos e compreendidos diante de tão diferentes mentes da sociedade.

(por Anouk)