quinta-feira, 19 de junho de 2008

"Mas acho que o grande DiMaggio se orgulharia hoje de mim"

Sonhava que nadava no universo. As estrelas pareciam luzes natalinas, em volta da fogueira aconchegante do Sol. O vácuo do éter entorpecia seu corpo e seus sentimentos enquanto flutuava livre, sem a massa da Terra mantendo-a presa ao chão. Chão. Voltou a sentir a cama lhe sustentando. Eram 7.43 de sábado - a insônia crônica fazia com que ela acordasse um bocado mais cedo do que gostaria - e o sol invadia seu quarto pelas brechas da cortina, contrastando com a brisa fria que trazia consigo. Se movendo o mínimo possível, alcançou seu laptop na mesa de cabeceira, ao lado do controle remoto - apanhou-o também. Entre espreguiçadas, ligou a televisão e desligou o celular; Não queria ouvir ninguém hoje. Infomercial, desenho, comercial, videoclipe, filme, filme, documentário, filme. Aquele acabara de começar, fato que, independente do que viria a seguir, tinha o poder de prendê-la até até o final. 
10.16. A tv era ignorada enquanto jogava o que parecia ser a milésima oitava partida de mahjongg . Fechou o computador em sinal de desistência. Rolou debaixo do edredon e observou por alguns momentos seu amplo quarto, predominantemente branco, com estantes repletas de livros, revistas e discos roubados de seu falecido pai. Caminhou arrastando os pés até as imensas janelas , que iam de poucos centímetros abaixo do teto até o chão; faziam-na se sentir pairando sobre a paisagem. Afastou as escuras cortinas com cuidado e se permitiu absorver o sol ainda matinal. 
12.32. Agarrada ao lençol na posição fetal, soluçava entre gemidos de dor; seus olhos ardiam. Lágrimas tardias caminhavam do meio do pescoço até a gola da camiseta. Ainda não havia comido nada naquele ensolarado dia de inverno. Sentia sangue imaginário sendo estancado por uma faca imaginária alojada em sua barriga ferindo o estômago, onde a morte é lenta.  Balbuciava seus pensamentos e voltava aos prantos. O intervalo entre as crises era de uns poucos minutos - até acabarem, pouco mais de uma hora.
13.58. Bebericava água velha de um copo que estava em cima da cabeceira da cama desde a noite anterior. Seu rosto não tinha expressão alguma - se não fosse pelo movimento manual que fazia ao mudar de canal, seria fácil deduzir que estava catatônica.
14.24. Apoiada na janela, acendia com dificuldade seu Parliament com um zippo prateado e mais estreito que o normal, que herdara de um velho namorado. Inspirava a fumaça profundamente, deixando-a invadir seu pulmão em seu estado mais dilatado; Sentia a pressão baixando aos poucos e o frio se tornando mais agradável. A fumaça era sua amiga - fazia com que ela se sentisse acompanhada e consolada. Observava o mundo em sua paisagem emoldurada por anéis de fumaça nicotinada, que garantiria um ar noir à sua visão caso já fosse noite. Sentia seu corpo leve e vazio; o cigarro escorregou por entre seus dedos e encontrou repouso no centro do cinzeiro. Sentada no chão, encostada no vidro protetor da parte inferior da janela, perdeu o ar e chorou.
16.37. Adormecida no chão, envolvida pelo edredon (que fora arrancado da cama com desleixo), as pontas do dedo quase tocando o pôr-do-sol gélido. Sonhava que voava dentro da piscina de Gellért.

por lili

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