A tosse do meu pai é alta demais. Ele tosse desde que voltou de viagem.
Ontem o jantar começou como sempre: Eu tagarelando empolgada com os olhos brilhando pela comida saborosa, minha irmã declamando a saúde em seu prato, meu irmão morrendo de sono, Thiago sorrindo pela falta de verde na salada.
A televisão ligada. Dessa vez poupando-nos assunto. Meu pai vidrado em outros momentos que não o seu. Momentos interpretando o nosso. Ele provou o bife, mastigou.
Mastigou.
Sua expressão não foi das melhores.
- Não gostei desse bife não...
- Então não come, e para de fazer essa cara! - Minha mãe respondeu sem pausa.
O jantar continuou no silêncio. Era domingo chuvoso. Ela continuava de tênis de corrida impedida de correr pelo tempo. Tirara o dia anterior para as compras. Comprou o bife pensando no meu pai, ela mesma não faz questão de carne,
só faz questão de correr.
Porém, não correu com a comida. Todo o cuidado. Única atividade do dia:
Jantar com todos os membros da família; Pai, mãe, filhos e agregado.
Momento divino:
Silêncio.
Silêncio não por respeito.
Silêncio denso que preocupa e torna os movimentos automáticos e pesados. Aumenta a pressão do ar nos rostos; Rugas de preocupação.
Preocupação com o que?
O nada do silêncio.
A falta de assunto preocupa.
Não meu pai, mas sua tosse, alta demais.
por anouk
Assinar:
Postar comentários (Atom)
3 comentários:
fofinho
anouk, mas é claro que me lembro! adorei o blog, a televisão ligada e a tosse do seu pai. voltarei.
beijoca
tambem senti tudo isso, sua decifradora de momentos!
Postar um comentário